Unidade 4 – Penas Restritivas de Direitos

As penas restritivas de direitos surgiram para substituir a pena privativa de liberdade que, em várias situações, já não alcança mais seus fins

  • São penas autônomas e substitutivas
    • Autônomas porque são aplicadas independentemente da pena privativa de liberdade
    • Substitutivas porque ficam no lugar na pena privativa de liberdade. Significa dizer que não são aplicadas em soma nem em combinação com essa, mas sim em substituição.
      • Ninguém é condenado à uma pena restritiva de direitos, a pessoa é condenada a uma pena de prisão que pode ser substituída por uma P.R.D

Histórico

  • Código de 1940
    • Nem se imaginava a possibilidade de penas restritivas de direitos
    • Existiam a pena privativa de liberdade, a multa e a pena acessória
    • Pena acessória: completava a principal. Por exemplo, uma pessoa era condenada à 5 anos de reclusão + a perda do direito de se candidatar à cargos públicos por 2 anos. Note, que as penas foram aplicadas em soma, a pena acessória depende da principal e existe para completá-la
      •  Iniciou-se uma discussão acerca da efetividade e da utilidade da pena acessória, que uma vez aplicada apenas como complementação não faria muita diferença na prática. Além disso, a pena privativa de liberdade seria considerada fraca ou insuficiente por precisar de um acessório, um complemento
  • Reforma de 1984
    • Nessa época, o Brasil já vinha assinando tratados internacionais se comprometendo à buscar alternativas para a pena privativa de liberdade que não alcançava mais seus fins como o desejado
    • Com isso, passaram a existir as seguintes penas: Privativas de liberdade, multa e restritivas de direitos
    • A pena restritiva de direitos não surgiu como substituição da pena acessória. Essa simplesmente deixou de existir, e aquela veio como uma alternativa à pena privativa de liberdade de curta duração, que era muito mais prejudicial do que benéfica para o condenado
    • Inicialmente, o requisito de substituição era que a pena privativa de liberdade fosse de até um ano
    • Além disso, só existiam três tipos de P.R.D
      • Limitação de fim de semana
      • Prestação de serviços à comunidade
      • Interdição temporária de direitos
    • Portanto, o início das penas restritivas de direitos foi tímido e não alcançava vastas possibilidades de substituição. Entretanto, o Brasil continuou assinando tratados internacionais que reconheciam a pena privativa de liberdade de curta duração como muito mais prejudicial do que benéfica ao réu. Por exemplo, um indivíduo que entrava na cadeia ladrão, tinha grandes chances de sair de lá traficante de drogas.
  • Lei 9714/1998
    • Em 1998, advém a lei 9.714 com o objetivo de ampliar e fomentar as possibilidades, as formas de aplicação e as espécies de penas restritivas de direitos
    • O requisito de substituição mudou de “até um ano” para “até quatro anos”
    • Além disso, foram criadas duas novas penas restritivas de direitos:
      • Perda de bens e valores
      • Prestação pecuniária
    • Essa lei alterou os artigos 44 e seguintes do Código Penal adaptando as mudanças

Natureza Jurídica (Art.44,CP)

1)Autônomas

Ser autônoma é o contrário de ser acessória. As P.R.D não são aplicadas em complementação, em conjunto com as penas privativas de liberdade. Por exemplo, não existe a possibilidade de uma pessoa ser condenada a 2 anos de reclusão E 1 ano de prestação de serviços a comunidade, isso não pode acontecer.

Portanto, as penas restritivas de direitos não são acessórias, são autonomias, ou seja, são aplicadas independentemente das penas privativas de liberdade.

  • Autônoma ≠ Acessória

2)Substitutiva

Ninguém é condenado à uma pena restritiva de direitos, ela vem em substituição à pena privativa de liberdade. Significa dizer, a pena privativa de liberdade é substituída pela pena restritiva de direitos.

  • Não são penas alternativas.
    • As penas alternativas são aquelas em que o juiz possui a opção entre uma pena e outra. Por exemplo, em um tipo penal existe a alternativa de ser aplicado pena privativa de liberdade OU multa.
    • A única pena alternativa existente no Brasil é a de multa e, mesmo assim, raríssimas vezes
    • Se o indivíduo preencher os requisitos do art.44,CP ele tem o direito à substituição de sua pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos. Não é uma mera opção do juiz, é uma obrigação do juiz
    • É possível encontrar autores se referindo às P.R.D como alternativas, em uma perspectiva generalizada de possibilidades, de alternativas para não aplicar a pena privativa de liberdade de curta duração. Mas, para o caso concreto e se referindo a natureza jurídica das P.R.D não há de se falar em pena alternativa, uma vez que elas são SUBSTITUTIVAS.

Espécies (Art.43,CP)

  • As penas restritivas de diretos são:
    1. Prestação pecuniária
    2. Perda de bens e valores
    3. Prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas
    4. Interdição temporária de direitos
    5. Limitação de fim de semana

Requisitos (Art.44,CP)

  • “A aplicação de pena restritiva de direitos em substituição à pena privativa de liberdade está condicionada a determinados pressupostos (ou requisitos)- uns objetivos, outros subjetivos-, que devem estar presentes simultaneamente“. São os seguintes:

1)Quantidade de pena aplicada (I)

  • Até 4 anos
    • 4 anos inclusive (interpretação “pro réu”)
    • Pena aplicada
      • Apesar de já ter existido a discussão de se o requisito se referia à pena aplicada ou à pena cominada, chegou-se a conclusão de que seria da pena aplicada

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  • “Quantidade de pena aplicada – pena não superior a quatro anos- reclusão ou detenção- independentemente da natureza do crime – doloso ou culposo – pode ser substituída por pena restritiva de direitos

2)Modalidade de execução (I)

  • Sem violência ou grave ameaça à pessoa
    • À pessoa, ou seja, “violência contra coisa, como ocorre, por exemplo, no furto qualificado com rompimento de obstáculo (art.155,§4,I), não é fator impeditivo, por si só, da concessão da substituição”
    • Salvo os crimes de menos potencial ofensivo, que poderão ter a pena substituída pela restritiva de direitos
      • Artigo: “Sobre a aplicação das penas restritivas de direito nos crimes de menor potencial ofensivo” revista IBCcrim.

3) Natureza do crime cometido (I)

  • Nos crimes culposos permite-se a substituição da pena privativa de liberdade independentemente da quantidade de pena aplicada 
  • Equivale dizer, qualquer que seja a pena de crime culposo caberá a substituição
  • Apesar de nenhum crime culposo ter pena superior a 4 anos, existe a possibilidade de um indivíduo ser condenado por mais de um crime culposo ou ter sua pena aumentada por algum motivo. Ainda assim, caberá a substituição
  • A conduta culposa nunca é violenta, o resultado pode até ser violento, mas a conduta nunca será. Nos crimes culposos o que se pune não é o resultado, mas sim a conduta

4) Requisitos subjetivos (II)

  • Réu não reincidente em crime doloso
  • Somente a reincidência em crime doloso pode, em princípio, impedir a substituição em análise
    • Por exemplo, um indivíduo que foi condenado por um crime culposo e depois praticou um crime doloso, ou foi condenado por um crime doloso e praticou novo crime culposo, e até mesmo tenha sido condenado por crime culposo e praticado novo crime culposo, será reicidente, mas sua reincidência não será a que impossibilita a substituição
    • O sujeito que não passará por esse requisito é aquele que tenha uma sentença penal condenatória transitada em julgado por crime doloso e pratique novo crime doloso
  • §3 : “Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime”
    • Se o juiz achar que a substituição será, no caso, uma medida socialmente recomendável, poderá proceder com a substituição, mesmo o indivíduo sendo reincidente em crime doloso
    • Análise individual
    • Salvo em casos de reincidência específica, ou seja, reincidência no mesmo crime. Nesse caso, o indivíduo estará absolutamente impedido de ter sua pena substituída
    • Portanto, “somente a reincidência específica constitui impedimento absoluto para a aplicação de pena restritiva de direitos em substituição à pena privativa de liberdade”
    • Em resumo: a princípio, o reincidente doloso não tem direito à substituição. Contudo, caso o juiz entenda que, em face da condenação anterior, a substituição seja uma medida socialmente recomendável, poderá concedê-la, desde que o sujeito não seja reincidente específico (ter sido condenado anteriormente por crime idêntico ao que voltou a praticar).
  • III- A culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente ( Reprodução do art.59)
    • Requisito subjetivo por excelência
    • O juiz só pode negar a substituição com base no art.59 se ele objetivar o requisito que é subjetivo (comprovar, justificar, motivar)

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  1. Reincidência ≠ Antecedentes
  2. É possível uma pessoa ter maus antecedentes e não ser reincidente. Isso porque, a reincidência dura 5 anos, no Brasil. Então, um sujeito que teve uma sentença penal condenatória transitada em julgado no ano de 2000, em 2005 não será mais reincidente, mas, ainda assim, terá maus antecedentes.
  3. Ter maus antecedentes significa possuir um S.P.C.T.J
  • Preenchendo os requisitos do art.44 a substituição se impõe
  • O juiz da sentença decidirá qual tipo de pena restritiva de direitos será aplicada analisando o crime
  • No entanto, para proceder com a substituição, o juiz deve seguir uma tabela (art.44, §2)

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Art.44,§2: “Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos; se superior a um ano, a pena privativa de liberdade por ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas  restritivas de direitos”

  • Quais penas restritivas de direitos serão aplicadas dependerá do juiz, mas sempre deve estar de acordo com a tabela

Multa substitutiva

  • A multa tem várias naturezas jurídicas:
    • Isolada
    • Cumulativa ( “e” multa)
    • Alternativa ( “ou”multa)
    • Substitutiva
      • Substitui a pena privativa de liberdade
      • Todas as 5 penas restritivas de direitos substituem a pena privativa de liberdade, mas nem todas as penas substitutivas são restritivas de direitos
      • A análise da natureza jurídica da pena deve ser feita em relação à pena privativa de liberdade. Portanto, a multa é substitutiva quando substitui a pena privativa de liberdade
      • Hipóteses:
        1. Condenações não superiores a um ano (isoladamente)
        2. Condenações superiores a um ano ( sempre cumulada com uma pena R.D, nunca isoladamente)

  • As penas privativas de liberdade substituídas pelas restritivas de direitos devem ter a mesma duração. Por exemplo, se um indivíduo foi condenado a 1 ano de reclusão e tiver sua pena substituída por prestação de serviço à comunidade, deverá prestar 1 ano de P.S.C
  • Quando aplicadas 2 penas restritivas de direitos, elas devem ser cumpridas concomitantemente. Por exemplo, uma indivíduo que foi condenado a cumprir 2 anos de limitação de fim de semana e prestação de serviço à comunidade, cumprirá essas penas nos mesmos dois anos. Não é permitido que ele cumpra primeiro uma pena (2 anos) e depois a outra ( + 2 anos), pois se configuraria uma situação de “bis in idem”, ou seja, o sujeito estaria cumprindo duas vezes a mesma coisa e isso não é permitido pelo ordenamento jurídico brasileiro

Conversão ( Art.44,§4)

“A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta. No cálculo de pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão”

  • No Direito Penal existem duas conversões diferentes:
    • A primeira, que é a tratada no Art.44,§4 é a conversão da pena restritiva de direitos para a privativa de liberdade por descumprimento de alguma restrição imposta.
    • A segunda está prevista na L.E.P e ocorre quando o juiz da execução, durante a execução, substitui a pena privativa de liberdade, daqueles que não conseguiram a substituição na sentença, em restritiva de direitos

Conversão do Art.44,§4

  • Sujeito está cumprindo pena restritiva de direitos e descumpre alguma restrição, terá sua pena convertida novamente em privativa de liberdade
  • “Ao adotar as penas restritivas era indispensável dotá-las de coercibilidade. E para isso nada melhor do que a previsão da possibilidade de convertê-las em pena privativa de liberdade, A finalidade da conversão, em outras palavras, é garantir o êxito das penas substitutivas”
  • Antes de 1998, em que as penas privativas de liberdade que poderiam ser substituídas eram as de até um ano, se o indivíduo descumprisse alguma restrição, retornava para a pena privativa de liberdade e cumpria toda a pena novamente, independentemente da quantidade de pena restritiva de direitos já cumprida.
    • Exemplo: Um sujeito condenado a 1 ano de reclusão no regime aberto tem sua pena substituída por 1 ano de prestação de serviço à comunidade. Faltando 1 mês para o fim de sua pena, ele descumpre uma restrição imposta. Nesse caso, de acordo com a legislação anterior, o indivíduo teria sua pena convertida em privativa de liberdade novamente e deveria cumprir 1 ano de reclusão no regime aberto, mesmo que já tivesse cumprido quase toda a pena com prestação de serviços a comunidade.
  • Após 1998, em que as penas privativas de liberdade que poderiam ser substituídas eram as de até 4 anos, “atendendo ao clamor da doutrina e da jurisprudência, adotou-se o princípio da detração penal, deduzindo-se o tempo de pena restritiva efetivamente cumprido ”
    • Ou seja, o sujeito que teve sua pena convertida para privativa de liberdade cumpriria apenas o restante da pena, no regime estipulado pela pena primitiva
    • O período de tempo cumprido com P.R.D é computado na conversão
    • Exemplo: A é condenado a 4 anos de reclusão no regime semi aberto e tem sua pena substituída por 4 anos de prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana. Faltando 1 ano para o fim de sua pena, A descumpre injustificadamente restrições impostas. À luz da nova legislação, A terá sua pena pena convertida para privativa de liberdade, mas apenas cumprirá o tempo de que falta, ou seja, 1 ano no regime definido pela pena primitiva. Portanto, A teria que cumprir 1 ano de reclusão no regime semi aberto

Quantum mínimo de conversão

  • No final do §4 do art.44, o legislador faz um ressalva referente ao período mínimo de pena restante para cumprir
    • ” respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão”
  • Isso quer dizer que, mesmo que o indivíduo descumpra alguma restrição faltando 5 dias para o fim de sua pena, por exemplo, terá que cumprir no mínimo 30 dias de pena privativa de liberdade
  • É uma forma da legislação coibir os “abusos de fim de festa” e manter a coercibilidade das penas restritivas de direitos
    • Exemplo: ” Indivíduo condenado a seis meses de prisão tem sua pena convertida em prestação de serviços à comunidade. Nos últimos dias começa a descumprir todas as restrições impostas. Ora, para se manter a coercibilidade do cumprimento das restrições impostas, essa conversão deverá ser, no mínimo, de trinta dias”
  • Entretanto, esse quantum mínimo caracteriza um “bis in idem”, pois o indivíduo terá que cumprir a mesma coisa duas vezes se o descumprimento ocorrer quando faltar menos do que 30 dias
    • Seria um “bis in idem” em menor escala do que o que ocorria na legislação anterior, mas não deixa de ser tecnicamente incorreto e inconstitucional
    • Mas, apesar disso, é previsto pelo Código Penal e deve ser observado

Conversão da L.E.P

  • Art.180: ” A pena privativa de liberdade, não superior a 2 anos, poderá ser convertida em restritiva de direitos, desde que: I- o condenado a esteja cumprindo em regime aberto; II- tenha sido cumprido pelo menos 1/4 da pena; III- os antecedentes e a personalidade do condenado indiquem ser a conversão recomendável
  • O Juiz da execução, durante a execução, pode substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos quando o Juiz da sentença não fez a substituição na sentença
  • Essa conversão possui requisitos diferentes da substituição feita na sentença. São eles:
    • Pena de até 2 anos
    • Boa personalidade e bons antecedentes
    • Ter cumprido, no mínimo, 1/4 da pena
    • Tem que estar em regime aberto
  • A conversão da L.E.P só é possível quando o sujeito não conseguir a substituição na sentença
  • Ocorre que, após 1998, a conversão da L.E.P não ocorre mais. Isso porque, a Lei de 1998 é mais abrangente que a L.E.P e, com isso, torna-se muito mais provável que o sujeito consiga a substituição na sentença do que uma conversão, já que ela não seria mais necessária
    • Antes de 1998, a substituição só era permitida para crimes com pena de até 1 ano, então aqueles que tinham sido condenados por crimes com pena de até 2 não conseguiam a substituição por não cumprirem um requisito do art.44, mas poderiam conseguir a conversão durante a execução da pena
    • Depois de 1998, a substituição passou a ser possível para crimes com pena de até 4 anos, com isso aqueles com a pena de até dois anos já conseguem a substituição na sentença. Para que a conversão continuasse a fazer sentido, e ocorresse na prática, o requisito de tempo de pena deveria mudar, por exemplo, para até 6 anos

Nova condenação

  • Antes de 1998, se ocorresse uma nova condenação por outro crime durante o cumprimento de pena restritiva de direitos, a conversão era automática
  • Após 1998, a nova condenação por outro crime passa a ser causa de relativa obrigatoriedade de conversão em pena de prisão
    • Vale dizer, o juiz deverá analisar a “possibilidade de as duas condenações serem compatíveis entre si, i.e, se o condenado consegue cumprir as duas penas simultaneamente “
    • Caso seja possível ,o juiz não será obrigado a converter a P.R.D em P.L
    • Exemplo: A foi condenado a cumprir prestação de serviço à comunidade e interdição temporária de direitos. Se ocorrer uma nova condenação por outro crime em que ele deva cumprir 2 anos de reclusão no regime aberto, a conversão não será obrigatória. Isso porque, é perfeitamente possível que A cumpra as 3 penas simultaneamente, uma não impede a outra.
    • O regime fechado é incompatível com qualquer outra pena

 

 

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