Recuperação de Empresas

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Introdução

  • É um instituto que sucede as concordatas que existiam na antiga lei de falência. Apesar de não se confundirem, vem da mesma origem histórica, ambas nascem de uma política interna dos empresários
  • Com a recuperação, assim como na concordata, o empresário vai socializar, ou seja, dividir com seus credores o risco de sua atividade, que se concentrado somente nele, não daria para ser suportado
    • Essa socialização dos riscos é o pressuposto da recuperação de empresas

Conceito

  • É o procedimento de jurisdição voluntária, pelo qual o devedor, em estado de crise econômico-financeira, requererá a repactuação de seu passivo, visando à preservação de sua empresa e a sua própria

Natureza Jurídica 

  • A recuperação de empresas tem dupla natureza jurídica, uma processual e uma material
    • Processual: procedimento de jurisdição voluntária
      • Pois não há lide
      • Os credores não são réus, mas sim interessados
      • Só tem legitimidade ativa o devedor , ninguém mais
      • Não há coisa julgada em sentido material, apenas em sentido formal
    • Material: natureza contratual
      • Como já decidiu o STF, quando julgou o Resp.1.314.209/SP
      • “Repactuação” ; é um contrato celebrado judicialmente

Finalidade

  • Lei 11.101/2005: Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
  • Tem como finalidade a preservação da empresa, mas também a preservação do empresário, ainda que de forma secundária

Requisitos e impedimentos

  • Requisitos
    1. Empresários regulares há mais de 2 anos
      • Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente: (…)

      • Esse prazo de 2 anos vem sendo mitigado pela jurisprudência, principalmente quando a recuperação é requerida em contestação de falência. Se faltam dias ou meses para se completar os dois anos de regularidade, a jurisprudência cem aceitando o pedido de recuperação, dependendo do caso concreto
    2. Não ser falido, ou, se for, estar reabilitado
      •   Lei 11.101/05, Art.48, I – não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes;
      • Isso porque a lei brasileira não permite mais a recuperação suspensiva
      • Precedentes excepcionalíssimos de recuperação suspensiva
        • Primeiro caso do Brasil: Indústria da Bala Chita
        • São casos extremamente raros
        • Em MG: TJMG – AI 0338.99.003226-4/013
    3. Não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos nesta Lei.
      • Existem crimes (todos com proteção patrimonial) que impedem a pessoa de ser empresário ou de gozar de benefícios da lei empresarial
      • Ter como administrador ou sócio controlador uma pessoa já condenada por um desses crimes já seria motivo suficiente para a empresa não ser regular, encontrando obstáculo no requisito 1 da recuperação
      • Problema: Princípio da não transcendência da infração
        • O crime não ultrapassa o infrator (CF, Art.5, XLV)
        • Pelo fato de o sócio ou administrador ter cometido o crime e o impedimento de postular a recuperação ser da sociedade, estaria transcendendo o crime para pessoa diversa
        • Opinião do professor: esse requisito é manifestamente inconstitucional
    4. Tendo o devedor gozado de uma recuperação, para que possa gozar no futuro de outra, há um prazo de desincompatibilização
      • Se já tiver gozado de uma recuperação judicial: prazo de 5 anos
      • Se já tiver gozado de uma extrajudicial : prazo de 2 anos
      • O prazo começa a contar do momento em que ele obteve a primeira recuperação
      • Lei 11.101/05, Art.48:
        •   II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial;
        • III – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial de que trata a Seção V deste Capítulo;
      • Lei 11.101/05, Art.161, § 3o O devedor não poderá requerer a homologação de plano extrajudicial, se estiver pendente pedido de recuperação judicial ou se houver obtido recuperação judicial ou homologação de outro plano de recuperação extrajudicial há menos de 2 (dois) anos.

Espécies 

A) Recuperação extrajudicial 

  • Na recuperação extrajudicial, o devedor convoca seus credores fora de juízo e repactua o passivo, visando a preservação de sua empresa e sua própria
  • Existem 3 credores e 5 créditos excluídos da recuperação extrajudicial, ou seja, que não podem ser repactuados
  • Credores excluídos (Lei 11.101/05, Art.161, §1)
    1. Fazenda Pública
      • O crédito tributário não pode ser objeto de transação, somente mediante lei de iniciativa do Poder Executivo
    2. Credor trabalhista 
      • O crédito trabalhista não pode ser objeto de transação durante o contrato de emprego, pois lhe falta a necessária autonomia da vontade para, desembaraçadamente, aceitar os termos do acordo
    3. Acidentado do trabalho 
  • Créditos excluídos ( Atenção: os créditos abaixo estão excluídos tanto da recuperação extrajudicial, quando da judicial)
    1. Alienação fiduciária em garantia
    2. Arrendamento mercantil (Lising)
    3. Reserva de domínio
    4. Contrato de antecipação de câmbio (ACC)
    5. Compra e venda de imóveis que o contrato tenha cláusula de irrevogável ou irretratável
  • Art. 49, § 3 Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4o do art. 6o desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial.

            § 4o Não se sujeitará aos efeitos da recuperação judicial a importância a que se refere o inciso II do art. 86 desta Lei. (ACC)

  • Detalhes sobre ACC
    • É um contrato de larga utilização prática pelos exportadores
    • Ao fechar um contrato de exportação, o exportador vai ao banco e antecipa o valor que receberia pelo contrato
    • O ACC é um contrato de fomento à exportação, que possui os juros mais baixos do mercado
    • O governo tem uma dotação orçamentária própria para financiar exportadores. Mas, essa dotação é limitada, por isso o Governo precisa receber o valor antecipado de volta na forma contratada, para que seja possível continuar fomentando a exportação. Por isso é que o crédito decorrente de ACC não se submete à recuperação judicial e nem à falência
    • Súmula 307, STJ: A restituição de adiantamento de contrato de câmbio, na falência, deve ser atendida antes de qualquer crédito.
      • Em caso de ACC é “restituição”, o dinheiro não é do falido e, por isso, deve ser restituído na forma contratada, não podendo ser repactuado
    • Súmula 36, STJ: A correção monetária integra o valor da restituição, em caso de adiantamento de câmbio, requerida em concordata ou falência.
    • Súmula 133, STJ: A restituição da importância adiantada, à conta de contrato de câmbio, independe de ter sido a antecipação efetuada nos quinze dias anteriores ao requerimento da concordata.
      • Não interessa a data de celebração do contrato
  • Trava bancária ao pedido de recuperação de empresas
    • A grande massa de garantias atualmente são feitas por meio de alienação fiduciária, que é um crédito excluído da recuperação ( a hipoteca e o penhor não estão excluídos)
    • Os bancos criaram uma figura chamada de antecipação de recebíveis, em que pede como garantia os recebíveis de cartão de crédito de um empresário
      • Ex: C vende R$ 1.000.000,00 no cartão de crédito em 6 meses. O Banco antecipa esse valor para C, e ele cede para o banco os recebíveis dos próximos 6 meses. Mas, o que ocorre muitas vezes é que , no segundo mês, C precise de mais dinheiro, vai ao banco e atencipa mais 1 mês, cedendo mais 1 mês de seus recebíveis e assim sucessivamente.
      • Esse contrato vai levando o devedor à ruína
      • Se C quisesse pedir uma recuperação ficaria impedido por uma trava bancária, pois se praticamente todo seu ativo está alienado fiduciariamente (tendo em vista que a grande maioria das vendas são feitas por cartão de crédito), não conseguiria levar uma recuperação adiante
    • Art.49, § 3o Tratando-se de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva, não se permitindo, contudo, durante o prazo de suspensão a que se refere o § 4o do art. 6o desta Lei, a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial.
      • A lei vai na espécie e não no gênero
      • Alienação fiduciária em garantia é um gênero que comporta 3 espécies
        • Propriedade fiduciária
        • Endosso fiduciário (alienação fiduciária em garantia de um título de crédito)
        • Cessão fiduciária (contrato pelo qual o devedor cede para o credor aquilo que ainda irá receber)
      • O artigo 49 diz que todos os créditos entram na falência e recuperação, exceto aqueles 5 listados no próprio artigo. Os Tribunais disseram que a exceção era somente da propriedade fiduciária, ou seja, não incluiria a cessão fiduciária. Com isso, começaram a promover o “destravamento da trava bancária”, incluindo os créditos decorrentes desses contratos de antecipação de recebíveis nas falências e recuperações. Porém, o STJ fez uma interpretação ampliativa dessa exceção e validou a trava bancária.
        • STJ: Resp. 1.202.918/SP
        • RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CÉDULA DE CRÉDITO GARANTIDAPOR CESSÃO FIDUCIÁRIA DE DIREITOS CREDITÓRIOS. NATUREZA JURÍDICA.PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA. NÃO SUJEIÇÃO AO PROCESSO DE RECUPERAÇÃOJUDICIAL. “TRAVA BANCÁRIA”. 1. A alienação fiduciária de coisa fungível e a cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, bem como de títulos de crédito,possuem a natureza jurídica de propriedade fiduciária, não se sujeitando aos efeitos da recuperação judicial, nos termos do art. 49, § 3º, da Lei nº 11.101/2005.2. Recurso especial não provido.(STJ – REsp: 1202918 SP 2010/0125088-1, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 07/03/2013, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/04/2013)
        • Hoje, argumenta-se que o contrato de alienação fiduciária por cessão é nulo,  pois não seria possível identificar o objeto do contrato no momento de sua celebração, por se tratar de venda futura
  • Obs: Mesmo sendo um crédito excluído, se o credor aceitou, o crédito poderá constar do plano de recuperação. O devedor é que não pode obrigar o credor de um crédito excluído a entrar no processo. Porém , no que se refere aos credores excluídos, mesmo com aceitação, eles não poderão participar da recuperação

Modalidades de recuperação extrajudicial

  1. De homologação judicial facultativa
    •  Art. 162. O devedor poderá requerer a homologação em juízo do plano de recuperação extrajudicial, juntando sua justificativa e o documento que contenha seus termos e condições, com as assinaturas dos credores que a ele aderiram.
    • Finalidade: Segurança da coisa julgada
    • Credores terão a certeza de que o devedor cumprirá as obrigações da forma pactuada
    • É um título judicial
    • Não tem como convolar recuperação extrajudicial em falência, por falta de autorização legal. O artigo 73 da lei 11.101/05 só autoriza a convolação da recuperação judicial
  2. De homologação judicial necessária (ou obrigatória)
    • Art. 163. O devedor poderá, também, requerer a homologação de plano de recuperação extrajudicial que obriga a todos os credores por ele abrangidos, desde que assinado por credores que representem mais de 3/5 (três quintos) de todos os créditos de cada espécie por ele abrangidos.
    • Toda vez que o devedor não obter a aceitação extrajudicial expressa de todos os credores que tinha a intenção de abranger em seu plano, mas conseguir a aceitação por mais de 3/5 (60%) financeiramente considerados, em cada classe de credores abrangida pelo plano, atendendo os requisitos legais e não estando impedido, poderá (poder-dever) requerer a homologação judicial
    • Homologado o plano pelo juiz, abrangerá 100% do passivo inicialmente pretendido pelo devedor
    • Naqueles casos em que mais de 3/5 dos credores aceitam o plano extrajudicialmente
    • É uma hipótese de contratação compulsória, pois o plano homologado irá abranger todos os credores, mesmo sem sua anuência
    • Finalidades:
      • Segurança da coisa julgada
      • Compelir os dissidentes extrajudiciais aos termos do plano proposto pelo devedor e homologado judicialmente

B) Recuperação Judicial 

  • Na recuperação judicial, o único credor excluído é a Fazendo Pública
    •  Art.6, § 7o As execuções de natureza fiscal não são suspensas pelo deferimento da recuperação judicial, ressalvada a concessão de parcelamento nos termos do Código Tributário Nacional e da legislação ordinária específica.
    • STJ: A execução continua em caso de recuperação judicial, mas é vedada a prática de atos que comprometam o patrimônio do executado se ele estiver em recuperação. Ou seja, é uma execução em que não se pode comprometer o patrimônio do executado, sendo que esse é o objetivo de uma execução
      • Com esse entendimento, o STJ esvasiou a execução
      • CC 107.065/RJ
      • AG RG CC 114.657/RS : União recorre e perde, pois essa jurisprudência é pacífica

Modalidades de recuperação judicial

  1. Especial
    • Lei 11.101/2005, Arts. 70 a 72
    • CF, Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.
      • Tratamento favorecido para microempresas e empresas de pequeno porte
      • Nesse contexto que se desenvolveu a recuperação judicial especial
      • Somente um microempresário ou um empresário de pequeno porte poderão postular a recuperação judicial especial
    • É uma exceção
    • Tem natureza jurídica diferente : não tem natureza de contrato, é um direito do devedor 
      • Atendidos os requisitos e não havendo impedimento, o juiz decreta a recuperação especial sem consultar os credores
      • Quando muito, poderá haver uma AGC para que eles deliberem se preferem a falência. Mas, não serão chamados para deliberarem sobre os termos do plano de recuperação
    • A antiga lei de falências dispunha que a concordata preventiva poderia ser:
      • Dilatória: devedor ganahva um prazo de até 2 anos, mas pagava 100%
      • Remissória: devedor pagava à vista, com desconto de 50%
      • Mista: conjugava prazos e descontos
        • Prazo de 6 meses: pagava 60%
        • Prazo de 12 meses: pagava 75%
        • Prazo de 18 meses: pagava 90%
      • Na recuperação judicial se manteve a mesma lógica
        • O prazo é de até 36 meses
        • Pode haver um plano dilatório, remissório ou misto, conforme a conjugação de prazos e descontos
    • O plano de recuperação judicial especial consiste no parcelamento do passivo em até 36 parcelas mensais iguais e sucessivas corrigidas pela taxa SELIC com carência para pagamento da primeira parcela de até 180 dias
    • Taxa de juros legal
      • Art. 71. O plano especial de recuperação judicial será apresentado no prazo previsto no art. 53 desta Lei e limitar-se á às seguintes condições: II – preverá parcelamento em até 36 (trinta e seis) parcelas mensais, iguais e sucessivas, acrescidas de juros equivalentes à taxa Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – SELIC, podendo conter ainda a proposta de abatimento do valor das dívidas;
      • CC, Art. 406. Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional.
        • Enunciado: juros legal seria 12% ao ano + correção monetária
      • STJ: o juros legal no Brasil é a taxa SELIC 
        • Resp 727.842/SP ; Resp 1.070.154/RJ; Resp 1.102.552/CE; Resp 1.112.743/BA
        • A SELIC já abrange juros e correção monetária. Então, havendo condenação em taxa SELIC, não há que se falar em correção monetária (STJ – Resp 666.676/PR; Resp 825.915/MS)
    • Todo devedor em recuperação judicial especial sofrerá 2 limitações à sua capacidade de contratar: 
      • 1- O devedor estará proibido de contratar novos empregados, salvo prévia e expressa autorização judicial (mesmo quando não implique em aumente de despesas)
      • 2- O devedor estará proibido de celebrar novos contratos que impliquem aumento de despesas 
  2. Ordinária
    • É a modalidade que vamos nos dedicar ao longo do curso (terá um post próprio)

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